Índio Mura

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Um olhar nativo e historiográfico do II Encontro da Cabanagem

Em comparação a outros movimentos regenciais, nota-se quão esquecida e alienada é a Cabanagem para os alunos nas escolas e para a população do Brasil, de um modo geral. Tornando-se isso propositalmente, nada mais do que a imposição da ignorância e do obscurecimento desse movimento ao povo do Brasil, haja vista que, seu caráter revolucionário-popular fundamentado nos ideais da Revolução Francesa fora capaz de depor governantes, intimidar um Império, organizar-se não apenas enquanto insurreição, mas sim como uma “revolução” que tomara de forma efetiva o poder na Província do Grão-Pará. Daí o temor de tomar este movimento como símbolo ou marco histórico de um Brasil Pós-Independência, pois se a Farroupilha - Também uma revolta do período regencial - já virara Minissérie na televisão brasileira, a Cabanagem nem sequer ganhou espaço e difusão na região do ocorrido – antigo Grão-Pará e atual Região Norte do país -, o que por si só denota o exímio esquecimento.
Vale ressaltar que desde a “Evolução Política do Brasil (1933)”, os estudos antropológicos e historiográficos caracterizam a Guerra da Cabanagem como uma das, senão a principal revolução política ocorrida no Brasil, em toda sua História após 1822. Muito além, o antropólogo inglês David Cleary apud MAHALEM DE LIMA (2008, p. 294), destacou no ano de 1998, que ela deve ser pensada como uma das maiores e mais abrangentes revoluções políticas de todo o Novo Mundo.
Por tudo isto, esperasse como muita expectativa que este II Encontro fundamente-se nas premissas de dar voz e vez aos documentos, relatos e memórias dos descendentes dos cabanos, no intuito de fazer uma releitura dos pequenos traços dessa revolta popular sob a ótica da Micro-História, haja vista que estes delineamentos também buscam auxílio na história escrita por Vicente Salles no livro “O Negro na formação da Sociedade Paraense”, em que o autor procura escrever a história defendida por Michelet, “a história daqueles que sofreram, trabalharam, definharam e morreram sem ter a possibilidade de descrever seus sofrimentos”.

Todavia, fato é, que ainda há muito a ser estudado sobre a Guerra da Cabanagem, sobre o seu palco de conflitos, sobre como se denominavam e qual era a ideologia dos cabanos, todavia é um massacre que a história daqueles que foram suplantados permaneça sepultada e caia no esquecimento perpétuo. Deve-se dar vez e voz aos descendentes das muitas vozes que se calaram e dos muitos corpos que jorraram sangue, na perspectiva de reescrever a história da cabanagem sob a ótica dos vencidos, desmistificando a historiografia tradicional que até hoje permeia nos livros e nas histórias disseminadas pelos discursos político-partidários.
Se a Revolução Francesa, a Revolução Inglesa e a Revolução Russa até hoje são cultuadas e idolatradas, porque não, dar a tamanha importância e enfoque a uma das maiores – se não a maior – Revolução do continente Americano: a Revolução Cabana.


¹Pesquisador de História da Amazônia e Co-coordenador do II Encontro da Cabanagem
     w.rodrigohistoriador@bol.com.br

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